sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

CPMF II: a luta por trás da luta




Além dos personagens políticos - FHC e Arthur Virgílio - que comandaram a derrota da CPMF, um outro personagem, de múltiplas personalidades e faces, a quem tampouco importa a situação humana dos beneficiários do SUS ou do bolsa família, venceu: o mercado, a "empresa" privada. Em especial aquela parcela dos sócios minoritários do mercado nacional, o empresariado nacional. Chamo esta parcela de burga selvagem. Vejamos porque seus interesses foram, momentaneamente, vitoriosos. E o que pode vir na sequência.

Empresas privadas lidam, principalmente, com 06 variáveis macro: preço final (preço de venda), custos variáveis de produção e comercialização (matéria prima, energia, fretes, etc.), margem ( preço final menos custos variáveis), custos fixos (majoritariamente remuneração e encargos c/ trabalhadores) , lucro e tributos. Destes, o que é que hoje está nas mãos do empresariado nacional mudar?

Preços de venda (PV) são limitados internacionalmente e pela concorrência interna, quando há. O preço de venda é igual ao menor preço do produto no mercado internacional posto no Brasil (preço no país de origem + frete, taxa portuária e imposto de importação). Quando há concorrência, em cima deste preço deve haver um desconto. O "preço" dos custos variáveis (CV) segue a mesma regra, com raras excessões. Aqui, pouco pode fazer a burga selvagem a não ser se sujeitar as referências estabelecidas por seus "pares" mais fortes, a burga americana, européia ou o Estado Chinês. Talvez possa, eventualmente, chorar no colo da mamãe Estado brasileiro por barreiras alfandegárias ou por matéria prima e energia mais barata - do que as referências internacionais - das empresas estatais.

As margens, resultado direto da conta PV - CV, são, portanto, dadas por variáveis exógenas. mercado internacional (preços internacionais mais custo de internação) para ser mais exato.

Mas e depois das margens?

Depois das margens, pagam-se as outras 03 variáveis: custo fixo, lucro e impostos. Estas três variáveis "brigam" por maiores fatias da margem. E o que acontece hoje nesse território de luta?

O principal componente da variável custo fixo são os chamados gastos com pessoal, a plebe que trabalha, produz. Atentem para o fato de que a massa salarial e o salário médio tem crescido significativamente nos últimos 3/4 anos no Brasil: entre 2004 e 2007 ambos cresceram a taxas reais ( acima da inflação) próximas ou superiores a 10% ( ver IPEADATA). Também levem em conta que o salário mínimo cresceu, também em termos reais, cerca de 32% comparando maio de 2007 a maio de 2002. Crescimento, pressionando a demanda por emprego, e alguma regulação - especialmente a política de sucessivos aumentos do salário mínimo - são dois importantes componentes para explicar o comportamento desta variável. Aqui o bicho começa a pegar na divisão da margem.

No entanto, tentar ganhar território na margem reduzindo salário mínimo ou médio, em uma conjuntura de recorrente denúncia das desigualdades sociais, desemprego, pobreza, é duro caminho. Ao menos, hoje, tem menos condições de universalização do que... baixar ou exterminar impostos.

Então, a luta empresariada por parte da FIESP contra a CPMF, que encontrou coro na vaidade de FHC e no "espiritismo" de Arthur Virgilio, é para tomar território, na margem, dos impostos em favor da remunerção do lucro. Se o governo não reagir mexendo em outros impostos, se não aumentar o salário mínimo ainda mais do que vem aumentando - o que poderia dar ao assalariado a parte tomada da CPMF- ou criar alguma regulação pró-investimento, os empresários vão entesourar ou consumir na Daslu a CPMF que ia pro SUS...


E la nave va...


P.S: Para os céticos desse raciocínio. Se à CMF estivesse vinculado o pagamento de juros da dívida pública - e não a saúde ou ao bolsa-família - não tenho dúvidas de que passaria. Mexeria com o sócio majoritário da burga tucana. O tremor na bolsa de valores é uma prova material disso: no interregno entre a queda da CPMF e a decisão do governo sobre o que fazer, reina a incerteza. Na incerteza, toda especulação é válida, inclusive a expectativa de que poderia haver redução do superávit primário (cujos recursos são destinados para o pagamento da dívida pública) para cobrir o rombo de 40 bilhões e manter os gastos em saúde e no bolsa família. Foi por isso que Lula mandou não reduzir a meta de superávit, para "acalmar o mercado".

2 comentários:

Unknown disse...

A CPMF certamente tem no preço dos carros pso considerável. Como se trata de mercado de alta competição, aguardemos 2008 para ver se haverá o desconto dos valores da CPMF no preço final dos automóveis.

Antares disse...

Creio que idéia do desconto sobre os produtos seja absolutamente louvável já que, ou ele estava previsto ou o empresário, e neste caso leve-se em consideração os milhares de micro empresários sem conhecimento de causa, nem mesmo se dão conta de que estavam pagando isso do bolso. Lógicamente que as grandes empresas e as instituições financeiras com seus profissionais bem pagos, provisionavam e repasavam aos clientes estes custos mas e os pequenos ? O que me assombra é a ignorância de certas pessoas quando em alguns outros blogs peguntam "se os empresários vão repassar os 40 bilhôes de Reais em descontos ?" Como se somente as empresas pagassem a malfadada CPMF.
Cada brasileiro pagava a CPMF em suas operações diárias, na compra de supermercado, no pagamento de pasagens, combustível e tudo o mais porque mesmo quando pagava em dinheiro já tinha sido subtraida a CPMF integral no momento do desconto na boca do caixa.
O maior descalabro foi entretanto a última proposta do governo para aprovar a CPMF,a de destinar todo o dinheiro dela para a saúde, como se não fosse para isso que ela tivesse sido criada desde o início. Parecia uma proposta irrecusável de algo que na prática era para ser assim desde o início.
Teve ainda a chantagem de que os hospitais iriam parar, o bolsa família iria perder,etc. O que não se pode negar é que mesmo com CPMF e tudo a saúde continuava mal, a previdência vai mal como sempre foram e não foi com a CPMF que deveria estar ajudando que tenha havido alguma melhoria nos anos de sua cobrança.Já esta declarado que o bolsa família irá continuar a despeito do fim do imposto. A única coisa que vai bem é o sistema financeiro que o governo brincou de taxar com mais 6% de CSLL mas que na verdade quem vai "pagar o pato" são os correntistas que terão as suas tarifas majoradas para cobrir mais este aumento. Quem viver verá.
Quem sabe se as despesas com cartões de crédito corporativos sem limite do governo acabarem, se as construções de anexos faraônicos de prédios públicos pararem, se as licitações milionárias para serviços de engraxate e barbearia de parlamentares declaradas em diário oficial forem extintas possamos pagar menos e com maior decência. Respeitosas saudações a todos.