terça-feira, 25 de maio de 2010

Só por cima do meu cadáver!!!


Faço minhas as palavras de Eduardo Guimarães, do Blog da Cidadania. Golpe aqui não!!!

Só por cima do meu cadáver

Vamos chamar pelo que é esse ensaio da próxima linha de ataque da direita brasileira: tentativa de golpe contra a vontade popular. Simples assim. Com base em interpretação dúbia de leis, a direita quer fazer a Justiça Eleitoral tirar da disputa pela Presidência da República a sua principal adversária exatamente no momento em que vai ficando claro que a eleição dela é vontade da maioria do eleitorado brasileiro.

E não é porque a lei eleitoral trata os brasileiros como burros que eles são, pois todos sabemos que vantagem ilegal tem, sim, o PSDB, pois tem toda mídia, inclusive  as concessões públicas de rádio e tevê, do lado dele, dizendo que Dilma “cometeu gafe”, que sua campanha “vai mal”, que ela está “empacada”, que um de seus marqueteiros é uma besta etc.

É de estranhar uma justiça eleitoral que não enxerga o abuso de poder econômico que são as propagandas do governo de São Paulo em todas as rádios e tevês durante toda a programação de todas as emissoras abertas e até fechadas à razão de pelo menos umas 10 peças publicitárias por hora, às vezes mais.

E essa, acima, é apenas uma das incoerências dos tucanos, que atacam adversários pelo que fazem desabridamente em termos de campanha eleitoral antecipada e de vantagem injusta sobre o adversário.

O PT teve o programa dele de dez minutos e os tucanos terão o seu. Podem aproveitar para difundir Serra ou não, mas já aproveitaram antes e há várias provas gravadas, a maioria das quais não vieram a público, sem falar que a vice-procuradora-geral eleitoral, Sandra Cureau, ao dizer que há mais provas contra o PT, contra o PSDB não disse que não há, mas que há menos, apenas.

O que é estranho é que a procuradora disse que há menos provas contra o PSDB porque ele não tem a máquina pública, sendo que, até algumas semanas, teve apenas o segundo orçamento do país nas mãos, o de São Paulo, e continua tendo, como se vê nas exaltações do governo tucano paulista em programas caríssimos em todos os horários de rádio e tevê.

Enfim, quero crer, ainda, que a Justiça Eleitoral deverá funcionar e que a doutora Sandra saberá explicar o grande número de posições contra o PT e o número zero de posições contra o PSDB que tem adotado, pois a aceitação da representação do Movimento dos Sem Mídia foi totalmente apartidária, para investigar institutos de pesquisa dos dois lados, se é que algum deles tem lado…

Mas, enfim, acho que chegou a hora de a onça beber água. Acho que a sociedade civil deve começar a se mobilizar já e os partidos da aliança governista que sustenta Dilma Rousseff devem pedir explicações à Justiça Eleitoral.

Quanto a mim, já me considero engajado em qualquer forma de resistência a um golpe análogo ao de Honduras, que a mídia brasileira carinhosamente chamou de “constitucional” – ou seja, um golpe de Estado, uma ruptura ilegal da democracia por definição, passa a ser compatível com a mesma Constituição que proíbe golpes, na visão da direita brasileira.

E também comunico que o Movimento dos Sem Mídia já se mobiliza para analisar e agir contra essa possibilidade de ruptura “constitucional” do processo eleitoral legal e democrático no qual somente o povo tem poder para decidir, pois considera que cassar uma candidatura que vem crescendo com intensidade devido ao amplo apoio popular, é golpe.

O próximo passo do MSM virá no momento oportuno, pois. Mas o da sociedade civil deveria começar já, na impossibilidade de ter começado ontem.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Mauro Santayana escreve sobre o affair Irã: uma luta entre o bom senso e a barbárie

De como exercer a ousadia moral

Por Mauro Santayana, em JBOnline.

Velha teoria explica as guerras generalizadas como inevitável irritação da História: as situações envelhecem e se tornam insuportáveis, para estourar nos conflitos sangrentos. Alguns as veem como autorregeneração do mundo, ao contribuir para o equilíbrio demográfico. Outros a atribuem à centelha diabólica que dorme no coração dos homens e incendeia o ódio coletivo. O mundo finará sem que entendamos a fisiologia do absurdo. Para os humanistas, são repugnantes os massacres coletivos tanto como os assassinatos singulares.

De qualquer forma, a História tem como eixo a tensão permanente entre guerra e paz; entre a competição e o entendimento; entre o egoísmo que se multiplica no racismo e a solidariedade internacional. Uma coisa é inegável: quando os mais fortes querem, não lhes faltam argumentos trôpegos para justificar a agressão. La Fontaine soube reduzir esse comportamento no diálogo entre o lobo e o cordeiro. Quando o lobo quer, os filhos são responsáveis por falsas culpas dos pais e as águas sobem os rios.

É interessante registrar, no episódio da questão do Irã, algumas dúvidas que assaltam o homem comum. A primeira delas – e devo essa observação a um amigo – é a do direito de os possuidores das armas atômicas decidirem quem pode e quem não pode desenvolver a tecnologia nuclear. Mais ainda, quando o árbitro maior é o governo do país que a usou criminosamente, ao arrasar, sem nenhuma razão tática ou estratégica, duas cidades inteiras e indefesas do Japão. Reduzidas as dimensões do absurdo, podemos aceitar como lícitas as associações criminosas, como as dos narcotraficantes dos morros. Possuidores de bom armamento, impõem sua lei às comunidades e constroem sua própria legislação, cobram tributos e exigem obediência, sob a ameaça dos fuzis e da tortura. Chegaremos assim a uma sociologia política, abonada indiretamente por Weber e outros, que admite todo poder de facto, sem discutir sua legitimidade ética.

O momento histórico é de grande oportunidade para a Humanidade – e de grande perigo, também. A República dos Estados Unidos é um lobo ferido em suas entranhas. Por mais disfarcem o choque, a eleição de Barack Hussein Obama lanhou as glândulas da tradição conservadora da Nova Inglaterra. A águia encolheu suas asas. A maioria dos estados e, neles, a maioria dos eleitores, decidiu por um homem mestiço, filho de pai negro e mãe branca, nascido em uma colônia dissimulada em estado, o Havaí; e que passou o período mais importante da formação, o da adolescência, na Ásia: na Indonésia muçulmana e no arquipélago em que nasceu.

No inconsciente coletivo, os Estados Unidos já sentem a decadência, que se acelerou com o neoliberalismo. Eles poderão administrá-la com inteligência, integrando-se em uma Humanidade que necessita, com urgência, de novos parâmetros e de nova tecnologia, capazes de preservar a natureza, hoje em acelerada erosão, ou entrar em desespero. Se entrarem em desespero, conduzirão o mundo a nova guerra, mas isso não parece provável, diante da crescente consciência antibélica de seu povo.

Por enquanto os falcões parecem contar com a Europa e com a China, no caso do Irã. Mas não há, nos horizontes movediços de hoje, país suficientemente forte, capaz de impor-se aos demais. A Europa desce a ladeira, com sua bolsa de euros de barro, e a União Europeia se encontra ameaçada de fragmentação. A China é uma nebulosa impenetrável. O capitalismo financeiro descolou-se de qualquer compromisso ético, se é que o teve um dia. O sistema se torna mais selvagem quando se vale dos instrumentos tecnológicos de operação universal e instantânea.

É nesse momento que a presença do Brasil começa a impor-se no cenário internacional. Não temos armas atômicas, não dispomos de exércitos numerosos e bem equipados, mas somos chamados a manter o bom-senso, e manter o bom-senso é exercer a ousadia moral.

Digam o que disserem os quislings domésticos, o Brasil ganhou o respeito do mundo ao buscar a paz no Oriente Médio. Se contribuirmos para evitar o conflito, nosso será o mérito; se não houver o êxito, fica, na História, o testemunho de um esforço destemido e honrado – e não menos meritório.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

A mistura de crise de hegemonismo, agressividade, hipocrisia e autismo auto-induzido da proposta de sanções do Governo Obama ao Irã


A leitura da proposta de sanções que madame Clinton quer ver aprovada no Conselho de Segurança da ONU não deixa sombra de dúvida: é uma dobradinha entre a estratégia de guerra permanente e o receio de perder o controle sobre a condução da política internacional. Controle, porque hegemonia já perderam...

O autismo auto-induzido, por exemplo, pode ser visto no parágrafo 34. Nesse, o governo do nobel Obama (sim, ele é o responsável), tal qual criança que pensa ter desaparecido ao tapar os olhos com as mãos, desconhece o fato de o Irã ter concordado com a transferência para outro país - Turquia - de 1,2 t de seu estoque de urânio em troca de 120 quilos do mesmo material, enriquecido, para seu Reator de Pesquisas. Quantidade esta que é exatamente a mesma proposta pela AIEA (Agencia Internacional de Energia Atômica). Diz este parágrafo que o Conselho de Segurança:

34. Elogia o Diretor Geral da AIEA pela sua proposta de um projeto de acordo entre a AIEA e os governos da República da França, da República Islamica do Irã e da Federação Russa para Assistência na Obtenção de Combustível Nuclear para o Reator de Pesquisas de Teerã, lamenta que o Irã não tenha respondido construtivamente a esta oferta, e encoraja a AIEA a continuar explorando essas medidas para construir confiança consistente com e em prol das resoluções do Conselho de Segurança;

Não repondeu a oferta cara-pálida? Respondeu dizendo que aceita os termos, mas que não confia seu urânio a França e a Russia e sim a Turquia. Uai, além de não confiarem no Irã, os EUA não confiam na Turquia? Só confiam em  países ocidentais (ou meio, como a Russia)?

Jeito de agir estadunidense: "ou jogam como eu quero ou eu levo a bola prá casa...". Mais cedo ou mais tarde o resto dos jogadores vai arranjar outra bola.

Para quem quiser ler o texto completo da proposta de sanções: Iran Resolution

terça-feira, 18 de maio de 2010

NOS EUA A SENHORA DA GUERRA MOSTRA SUAS GARRAS

Contra os fatos, os Estados Unidos insistem em manter a estratégia de sanções contra o Irã. Não há uma só prova de que o Irã desenvolve armamento nuclear. O Irã assinou um acordo aceitando enriquecer urânio fora de suas fronteiras. Mas o que interessa ao EUA não é nada disso, é, sim, a subordinação de uma nação soberana a seus interesses econômicos e geopolíticos. E sabem que essa só virá com uma vitória militar. Só que precisam debilitar economicamente o Irã para depois organizar uma ofensiva bélica.
A senhora da guerra, sucessora de Bush, mostra suas garras...

domingo, 16 de maio de 2010

Brasil, Turquia e Irã fecham acordo histórico: E Lula subiu a montanha...

Do Blog do Luis Nassif:

 Irã, Turquia e Brasil chegam a acordo, diz chanceler turco



da Reuters
colaboração para a Folha

O ministro de Relações Exteriores da Turquia, Ahmet Davutoglu, disse neste domingo que foi alcançado um acordo entre Irã, Turquia e Brasil sobre a troca de combustíveis nucleares, decisão que pode por fim à disputa com o Ocidente sobre o programa nuclear do Irã. Quando questionado por jornalistas em Teerã se haveria um acordo sobre a troca de combustível, ele respondeu: “Sim, isso foi alcançado após quase 18 horas de negociações”.

Segundo o chanceler turco, o anúncio oficial pode ser feito na segunda-feira pela manhã, após revisão pelos presidentes brasileiro e iraniano e o primeiro-ministro turco, que chegou à capital iraniana neste domingo.

Os presidentes brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, e iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, falaram neste domingo em entrevista coletiva sobre o interesse de incrementar as relações comerciais entre seus países. Porém, eles não tocaram na questão nuclear, ponto central do encontro, como já havia acontecido mais cedo, na nota oficial divulgada no site do governo iraniano.

Os EUA e alguns de seus aliados acusam o Irã de desenvolver um programa nuclear com fins militares, mas Teerã defende que a finalidade é pacífica e se recusa a negociar. Os EUA pressionam por uma quarta rodada de sanções do Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas) contra o país do Oriente Médio.

Segundo o site da TV iraniana Alallam, os chanceleres de Irã, Turquia e Brasil mantiveram um encontro trilateral neste domingo para discutir, entre outros assuntos, a troca de urânio iraniano.

O porta-voz da chancelaria iraniana, Ramin Mehmanparast, tinha dito que Teerã chegou a um acordo sobre a quantidade de urânio a ser trocada e a modalidade da troca –simultaneamente ou em lotes–, informa a Alallam. “Há um acordo sobre o momento e o volume de combustível a ser trocado”, disse ele. “Mas ainda falta decidir o local e, se houver garantias concretas, o Irã está disposto a negociar.”

Proposta

A proposta de Brasil e Turquia era pressionar os líderes iranianos a rever uma proposta sob a qual o Irã enviaria urânio baixamente enriquecido a outro país e, em retorno, receberia urânio altamente enriquecido — um plano que fracassou em outubro do ano passado.

Um acordo apresentado pela ONU em outubro oferecia ao Irã que enviasse 1.200 quilos de urânio de baixo enriquecimento –o suficiente para a fabricação de uma bomba se enriquecido no patamar necessário– para a França e para a Rússia, onde seria convertido em combustível para um reator de pesquisas em Teerã.

O Irã afirmou na época que só trocaria o seu material por urânio em níveis maiores de enriquecimento e somente no seu próprio território, condições que as outras partes envolvidas no acordo consideraram inaceitáveis.

O acordo foi interrompido na época. O Brasil e a Turquia, ambos membros não permanentes do Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas), ofereceram-se para mediar as negociações e tentar convencer o Irã a rever a oferta.

Os Estados Unidos e países aliados estão em negociação para impor uma quarta rodada de sanções da ONU ao Irã. Washington acusa Teerã de tentar ganhar tempo ao aceitar a proposta de mediação de Lula.

O Brasil já apresentou uma proposta segundo a qual o Irã trocaria urânio pouco enriquecido por combustível nuclear na Turquia, país que tem estreitos laços tanto com Ocidente como com o Oriente Médio. O Irã enviaria urânio ao exterior e o receberia de volta enriquecido a 20%, nível suficiente para fins pacíficos.

Segundo a imprensa iraniana, Ahmadinejad tinha dito que aceitava “em princípio” a proposta de Lula durante uma conversa telefônica com o líder venezuelano, Hugo Chávez.

Viagem surpresa

O primeiro-ministro da Turquia, Tayyip Erdogan viajou a Teerã neste domingo para se reunir com o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, e com o líder iraniano, Mahmoud Ahmadinejad.

“Estou indo ao Irã porque uma cláusula será acrescentada ao acordo que diz que a troca será feita na Turquia”, disse o premiê. “Teremos a oportunidade de começar o processo em relação à troca”, disse Erdogan. “Eu garanto que encontraremos a oportunidade para superar esses problemas, se Deus quiser.”

Roda de apostas

Durante visita oficial à Rússia, em entrevista concedida no Kremlin, Lula disse que há 99% de chances conquistar um acordo com o Irã durante sua passagem pelo país. Ao seu lado, o presidente russo, Dmitri Medvedev, não foi tão otimista: afirmou que as chances são de 30%.

“Se não chegarmos a um acordo, volto para casa feliz, porque ao menos não fui negligente”, disse o presidente.

Considerado um carismático negociador, Lula conta com o apoio da França, Turquia e da Rússia, ainda que comedido, mas os EUA já advertiram que o Irã não leva o encontro a “sério”.

Para a secretária de Estado americana, Hillary Clinton, Lula enfrenta uma “montanha a ser escalada” para tentar persuadir o Irã a limitar suas ambições nucleares.

“Eu disse a meus colegas em muitas capitais do mundo que eu acredito que não teremos nenhuma resposta séria dos iranianos até que o Conselho de Segurança aja”, disse ela, referindo-se aos esforços liderados pelos EUA para a imposição de uma quarta rodada de sanções da ONU contra o Irã.

O porta-voz do Departamento de Estado dos Estados Unidos, P.J. Crowley, disse que se o Irã não mudar seu comportamento após a visita de Lula, o país deverá pagar o preço.

“Neste ponto acreditamos que deverá haver consequências por um fracasso em responder”, disse Crowley.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Novos tempos, novas formas


Hoje li a seguinte notícia, no blog do Eduardo Guimarães, o Cidadania.com:

Justiça e PF investigarão pesquisas

A quem possa interessar:

Conforme informações obtidas pelo Departamento Jurídico do Movimento dos Sem Mídia — MSM – na tarde desta 3a. feira, 11/05/2010, em Brasilia – DF, a Vice-Procuradora Geral Eleitoral do Ministério Publico Eleitoral Federal, Dra. Sandra Cureau, acolheu a representação de nossa Organização no sentido de que as pesquisas feitas e por fazer em 2010 pelos institutos de pesquisa Datafolha, Ibope, Sensus e Vox Populi, sejam auditadas.

A Procuradoria determinou em despacho que “se extraiam cópias na íntegra da Representação Eleitoral do MSM e da lista de adesões dos cidadãos brasileiros que a apoiaram, remetendo os documentos à Superintendência da Polícia Federal em Brasília – DF, para que a Polícia Federal proceda a Abertura de inquérito Policial para apurar suposta prática de Crime Eleitoral de Realização e Divulgação de Pesquisa Eleitoral Fraudulenta”.

O processo junto à Procuradoria Geral Eleitoral – DF recebeu o número 4559.2010-33

Atenciosamente,

Eduardo Guimarães

Movimento dos Sem Mídia

Presidente

O que este fato revela, junto com inúmeros outros que poderíamos listar aqui, é que a blogosfera (como é conhecido o universo habitado pelos blogueiros) mais do que uma mídia, uma forma de informar-se, organizar informação e produzir opinião, é um movimento social. O mais recente movimento social, sobretudo mas não somente, urbano. Com potencial para induzir e sustentar, em aliança com outros movimentos e com o devido apoio institucional,  processos de mudança social e política.

Em um passado não muito distante, décadas de 80 e 90, em Porto Alegre, os movimentos sociais comunitários cumpriram o papel de indutores e base de sustentação de um projeto de mudança social, articulados em um processo de participação que ficou conhecido como Orçamento Participativo. Este processo resultou, entre outras coisas, na amplificação da agenda destes movimentos:  assegurou que esta saísse do nicho clientelista e tornou-a amplamente conhecida e legitimada na sociedade local. Esta amplificação foi feita através da construção de uma relação democrática, direta e autonoma deste movimento com o Estado.


Um programa de governo de esquerda deveria, prioritariamente, pensar em estruturas e processos que permitissem a participação democrática, permanente e direta, mantendo autonomia, deste movimento social no processo de reorientação do Estado para uma estratégia de mudança social. As que foram construídas até aqui não me parecem dar conta, uma vez que não lidam com o mundo dito "virtual" (aliás, virtual apenas quanto a forma).

A formação de uma rede, reconhecida por este movimento e pelo Estado, onde fossem discutidos e decidos formatos de politicas públicas poderia ser um bom começo...

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Hoje estreiou Sul21: para quem tem este espirito

Dilma: "Tem gente que passou a vida inteira querendo ser Presidente. Eu era mais modesta. Fui para a atividade pública porque queria servir."

Dilma Rousseff
Entrevista a Revista Isto É. (www.istoe.com.br)
(07.05.2010)




Com um calhamaço de fichas repletas de dados sobre realizações do governo Lula sempre ao alcance das mãos, a candidata petista à Presidência da República, Dilma Rousseff, falou por quase quatro horas sobre seus planos para o Brasil, numa entrevista exclusiva a editores e articulistas de ISTOÉ. Em poucos momentos ela consultou a papelada. Mas seguidamente procurou com os olhos um contato com sua equipe de assessores que lhe passava, sempre, sinais de aprovação. Dilma não refugou assuntos. Falou sobre questões pessoais e afetivas com a mesma naturalidade com que abordou temas da política e da economia. Emocionou-se quando relembrou seus dias de luta contra o câncer.
Vestida com um terninho clássico, de tecido leve e claro, penteada e maquiada com discrição, Dilma Rousseff parece à vontade na condição de candidata. Já suavizou a postura de gerente técnica que ostentava como ministra do governo Lula. Mesmo que jamais tenha buscado votos em sua vida pública, faz promessas de candidata e demonstra apetite para contrapor-se ao candidato da oposição, José Serra. Diz que a missão de seu governo é erradicar a pobreza, mas não estabelece prazos. Anuncia ainda mudanças na condução do Banco Central e a intenção de criar um fundo federal para compensar perdas regionais na reforma tributária que se compromete a implementar. A seguir, os principais trechos de sua entrevista:
ISTOÉ – Por que a sra. acha que o presidente Lula a escolheu para sucedê-lo e quando exatamente se deu isso?
Dilma Rousseff – O presidente Lula me escolheu quatro vezes. A primeira foi na transição do governo de Fernando Henrique para o governo Lula, em 2002. O presidente me chamou para fazer a coordenação da área de infraestrutura porque me conhecia das reuniões do Instituto de Cidadania. Depois ele me escolheu para ser ministra de Minas e Energia. E, em 2005, para ser ministra da Casa Civil. Por último, me escolheu para ser pré-candidata para levar à frente o projeto de governo. Acho que me escolheu porque acompanhei com ele a construção de todos os grandes projetos. O presidente sabe que nós conseguimos, juntos, fazer estes projetos.
ISTOÉ – Ser presidente era uma ambição pessoal da sra.?
Dilma – É um momento alto da minha vida, talvez o maior. Tem gente que passou uma vida inteira querendo ser presidente da República. Eu era mais modesta. Fui para a atividade pública porque queria servir. Pode parecer uma coisa falsa, mas acho que se pode servir à população brasileira no setor público. Sempre acreditei que o Brasil podia mudar, mas isto era uma questão longínqua. Quando o Lula me chamou para a chefia da Casa Civil, ele pretendia que o governo entrasse na trilha do crescimento e da distribuição de renda para que o Brasil desse um salto, e vi nisso uma grande oportunidade.
ISTOÉ – A sra. se considera preparada para o cargo?
Dilma – Tenho clareza, hoje, de que conheço bem o Brasil e os escaninhos do governo federal. Então, sem falsa modéstia, me acho extremamente capacitada para o exercício desse cargo. E acredito que o fato de não ser uma política tradicional pode incutir um pouco de novidade na gestão da coisa pública. Uma novidade bem-vinda. Na minha opinião, critérios técnicos se combinam com políticos. Escolher onde aplicar é sempre um ato político. Por exemplo, eu acho que a grande missão nossa é erradicar a pobreza e que é possível erradicá-la nos próximos anos. Isto é um ato político. Outra pessoa pode escolher outra coisa.
ISTOÉ – No horizonte de um governo, é possível erradicar a pobreza?
Dilma – Tem um estudo do Ipea mostrando que até 2016 é possível erradicar a pobreza extrema, a miséria. Mas o empresário Jorge Gerdau costuma dizer que “meta que se cumpre é meta errada”. Metas não são feitas para cumprir, mas para estabelecer um objetivo, criar uma força. Assim, acredito que o prazo de 2016 é viável, mantido o padrão do governo Lula. Nossa meta pode ser ainda mais ousada. Só não vou dizer qual porque, se passar dois dias sem cumpri-la, vão dizer: “Não cumpriu a meta”, como fazem com o PAC. Atrasar uma obra de engenharia em seis meses é a catástrofe no Brasil.
ISTOÉ – O presidente Lula também trabalhou com metas quando foi candidato. Ele falava em dez milhões de empregos...
Dilma – Acho que a gente fecha em 14 milhões. Falei com a área econômica de dois bancos e ambos consideram que o crescimento do PIB será de 6,4%, podendo chegar a 7%, o que dá condições para se chegar a estes 14 milhões de empregos. Os dados da produção industrial que fechamos em março apontam um crescimento muito robusto e sustentável porque são os bens de capital que estão puxando esse desempenho.
ISTOÉ – O Banco Central está preocupado com este crescimento...
Dilma – Não, o Banco Central está preocupado com outra coisa. Ele não pode estar preocupado com a expansão dos bens de capital porque isso é virtuoso.
ISTOÉ – Parece que há uma visão dissonante entre o Banco Central e a Fazenda sobre o desempenho da economia. Como a sra. vê essa questão?
Dilma – Os dois trabalham em registros diferentes. O BC faz uma análise necessariamente de curto prazo, porque ele trabalha com questões inflacionárias conjunturais, mais imediatas. Ele olha a pressão na hora que ela acontece. Já a Fazenda tem uma visão de mais médio e longo prazo. É outro registro. A Fazenda tem consciência de que o Brasil está em uma trajetória de estabilidade e de sustentabilidade. Agora, isso não é incompatível com o fato de você ter pressões inflacionárias imediatas. Acho que foi importante o aumento dos juros na última reunião do Copom.
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“Tem gente que passou uma vida inteira querendo ser presidente
da República. Eu era mais modesta”
ISTOÉ – Isso não dá munição para os seus adversários?
Dilma – Nós já tivemos duas experiências muito ruins de, durante a eleição, fingir que é uma coisa e, depois, virar outra. Uma na virada do primeiro para o segundo mandato do Fernando Henrique Cardoso e outra no Plano Cruzado. Hoje somos perfeitamente capazes de elevar a taxa de juros e assumirmos as consequências, sem que isso signifique uma perda. Temos integral compromisso com a estabilidade.
ISTOÉ – A sra. concorda com a política de juros do BC?
Dilma – Concordo. Acho que, da ótica do BC, ele fez o que precisava fazer. Nos Estados Unidos, onde há um histórico maior de estabilidade, o Federal Reserve tem dois olhos: um que olha a inflação e outro o emprego.
ISTOÉ – O nosso só olha a inflação.
Dilma – No meu governo acho que, mais para o final, teremos condições de olhar as duas coisas: inflação e emprego.
ISTOÉ – Teremos um BC diferente?
Dilma – Teremos uma política e uma realidade diferentes. Porque, para o BC fazer isto, é preciso uma redução da dívida líquida em relação ao PIB. O Brasil converge para condições monetárias de estabilidade que permitirão a combinação de outras variáveis. Criamos robustez econômica suficiente para fazer isso.
ISTOÉ – A sra. vai enfrentar um candidato que também se apresenta como um pós-Lula. O que a diferencia dele?
Dilma – Só se acredita em propostas para o futuro de quem cumpriu suas propostas no presente. O que nos distingue é que nós fizemos, nós sabemos o que fazer e como fazer. Mais do que isso, os projetos dos quais eu participei – 24 horas por dia nos últimos cinco anos – são prova cabal de que somos diferentes.
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“Sou católica, mas antes de tudo cristã.
Tive minha formação no Sion”
ISTOÉ – A sra. não acha importante o fato de o PT ter assumido o governo com um quadro de estabilidade da moeda?
Dilma – Eu não queria fazer isso, mas, se vocês insistem, vamos lá: recordar é viver. Nós assumimos o governo com fragilidades em todas as áreas. Taxas de inflação acima de dois dígitos, déficit fiscal significativo e, sobretudo, uma fragilidade externa monstruosa. Tínhamos um empréstimo com o FMI de US$ 14 bilhões. A margem de manobra nessa situação é zero. Você se coloca de joelhos junto aos credores internacionais. Quem fala com você é o sub do sub do sub. Isso não foi momentâneo. Foi uma década de estagnação, de desemprego e desigualdade. Nós tivemos, claro, coisas boas. Uma delas é a Lei de Responsabilidade Fiscal.
ISTOÉ – Mas já cogitam mudá-la. A sra. é favorável a isto?
Dilma – Depende. Acho que para mexer em coisas que têm dado certo é recomendável caldo de galinha e muita calma. Mas, voltando ao recordar é viver, o Plano Real também teve mérito. Já em outros pontos fomos salvos pelo gongo. O País deve dar graças a Deus por não terem partido a Petrobras em pedaços, não terem privatizado o setor elétrico, Furnas, Eletronorte, Eletrosul. A privatização da telefonia foi correta, mas não acho hoje muito relevante. Hoje a banda larga é mais importante que a telefonia.
ISTOÉ – A sra. acha que Serra seria a continuidade de FHC?
Dilma – Não tenho nenhum comentário a fazer sobre a pessoa José Serra. Tenho respeito por ele. Mas nós representamos projetos políticos distintos. Nós temos uma forma diferente de olhar o Estado.
ISTOÉ – Ele também se apresenta como um economista da linha desenvolvimentista.
Dilma – Acho muito significativa essa tentativa de borrar diferenças. Duvido que estariam borrando diferenças se o governo do presidente Lula tivesse menos que 76% de aprovação. Duvido. Há, neste processo, a tentativa de esconder o fato de que somos dois projetos. Tenho orgulho de ter sido ministra do presidente Lula. Devemos comparar as experiências de cada um. Eles diziam que não sabíamos governar, que só tivemos sorte. A gente gosta muito de ter sorte. Graças a Deus não somos um governo pé-frio. Mas quando chegou essa crise, muito maior que a de 1929, mostramos enorme competência de gestão, capacidade de reação e ousadia.
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“Lula é uma pessoa extremamente afetiva. Ele
não te olha como se fosse um instrumento dele”
ISTOÉ – O governo FHC foi incompetente?
Dilma – O governo FHC representa um processo em que não acredito. Não acredito num projeto de privatização de rodovias que aumenta o custo Brasil por causa dos pedágios, que embute taxas de retorno de 26% ao ano. Em estradas federais, a qualidade melhorou muito com pedágios bem menores por uma razão muito simples: nós não cobramos concessão onerosa. Logística é igual a competitividade na veia.

STOÉ – O que a sr. faria diferente do atual governo?
Dilma – Nós tivemos que trocar o pneu do carro com ele andando. Algumas coisas concluímos, em outras não conseguimos avançar. Acho imprescindível, para o patamar de crescimento atingido, fazer a reforma tributária. Não é proposta, é uma exigência. Se quisermos aumentar nossa produtividade e, consequentemente, nossa competitividade, precisamos acabar com coisas absurdas como a tributação em cascata.
ISTOÉ – O governo atual também diz que tentou fazer isto.
Dilma – Não deu agora porque reforma tributária significa conflito federativo. Aprendemos que é inviável fazer reforma tributária sem compensações porque ela tem tempos diferentes. Para neutralizar o efeito negativo da perda de arrecadação, vamos criar um fundo de compensação. Este é o único mecanismo negociável.
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“Depois que minha filha nasceu, tive uma gravidez
tubária. Eu não podia mais ter filho”
ISTOÉ – Os acordos políticos resultarão ainda em loteamento de cargos?
Dilma – Não. O apoio político é totalmente legítimo. Em todos os países há uma composição política que governa. O que você tem que exigir é padrões técnicos. Lutei muito para implantar isso no governo.
ISTOÉ – Está satisfeita com o que foi feito?
Dilma – Acho que podemos melhorar.
ISTOÉ – A sra. será avó, em breve. E provavelmente seu neto nascerá num hospital privado e se educará numa escola particular. Em que momento a sra. acha que o Brasil estará pronto para mudar isso?
Dilma – Quero muito que isso aconteça porque me esforcei muito para estudar numa excepcional escola pública, que era o Colégio Estadual de Minas Gerais. A gente fazia um vestibularzinho para passar ali. Era difícil. Este é o grande desafio do Brasil. Para a educação ser de qualidade, não é só prédio, laboratório, banda larga nas escolas. É, sobretudo, professor bem remunerado e com formação adequada.
ISTOÉ – Seu neto vai ter uma superavó, moderna, talvez presidente da República. Essa avó moderna também namora?
Dilma – Olha, eu não namoro atual­mente, apesar de recomendar para todo mundo. Acho que faz bem para a pele, para a alma, faz todo o bem do mundo.
ISTOÉ – Uma vez eleita, a sra. assumiria um relacionamento? A sra. casaria no meio do mandato?
Dilma – A vida não é assim, tem que se confluírem os astros...Eu não sou uma pessoa carente propriamente dita, tive uma vida afetiva muito boa, muito rica. Mas nos relacionamentos há uma variá­vel que é estratégica, que é com quem eu vou casar. Essa variável estratégica eu tenho que saber, porque assim, no genérico, isso não existe. Agora, vamos supor que a pessoa seja maravilhosa e eu esteja apaixonadíssima...
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“Não sou uma pessoa carente propriamente
dita. Tive uma vida afetiva muito boa, muito rica”
ISTOÉ – A sra. está fechada para isso?
Dilma – Não, ninguém pode estar na vida. Mas para mim é uma coisa muito distante. E depende dessa variável: que noivo é esse?
ISTOÉ – Qual a sua posição em relação ao aborto? A sra. passou pela experiência de fazer um aborto?
Dilma – Eu duvido que alguma mulher defenda e ache o aborto uma maravilha. O aborto é uma agressão ao corpo. Além de ser uma agressão, dói. Imagino que a pessoa saia de lá baqueada. Eu não tive que fazer aborto. Depois que minha filha nasceu, tive uma gravidez tubária, eu não podia mais ter filho. E antes disso só engravidei uma vez, quando perdi o filho por razões normais. Tive uma hemorragia, logo no início da gravidez, sem maiores efeitos físicos.
ISTOÉ – Isso foi antes de sua filha nascer?
Dilma – Foi antes. Tanto é que eu fiquei com muito medo de perder minha filha, quando fiquei grávida. Mas todas as minhas amigas que vi passarem por experiências de aborto entraram chorando e saíram chorando. Eu acho que, do ponto de vista de um governo, o aborto não é uma questão de foro íntimo, mas de saúde pública. Você não pode hoje segregar mulheres. Deixar para a população de baixa renda os métodos terríveis, como aquelas agulhas de tricô compridas, o uso de chás absurdos, de métodos absolutamente medievais, enquanto as mulheres de renda mais alta recorrem a clínicas privadas para fazer aborto. Há muita falsidade nisto.
ISTOÉ – A sra. defende uma legislação que descriminalize o aborto?
Dilma – Que obrigue a ter tratamento para as pessoas, para não haver risco de vida. Como nos países desenvolvidos do mundo inteiro. Atendimento público para quem estiver em condições de fazer o aborto ou querendo fazer o aborto.
ISTOÉ – A Igreja Católica se opõe a isto.
Dilma – Entendo perfeitamente. Numa democracia, a Igreja tem absoluto direito de externar sua posição.
ISTOÉ – A sra. é católica?
Dilma – Sou. Quer dizer, sou antes de tudo cristã. Num segundo momento sou católica. Tive minha formação no Colégio Sion.
ISTOÉ – A sra. passou por um tratamento para curar um câncer e precisa submeter-se a revisões periódicas. O que deu sua revisão dos seis meses?
Dilma – Agora faço de seis em seis meses. Fiz há pouco, em abril, e deu tudo perfeito.Existe na sociedade e em cada um de nós uma visão ainda muito pesada sobre a questão do câncer. E isso provoca nas pessoas muita dificuldade em tratar a doença Eu tive a sorte de descobrir cedo. Estava fazendo um exame no estômago e resolveram ver como estavam minhas coronárias. Eu fui para fazer um exame de coronária e descobri um linfoma.
ISTOÉ – Como a sra. reagiu?
Dilma – A notícia é impactante. Na hora eu não acreditei, estava me sentindo tão bem. Há uma contradição entre o que você sente e o que te falam. Para combater o câncer você precisa encontrar forças em você mesma. Tem que se voltar para você, não pode, de jeito nenhum, se entregar. Depois, você combate porque conta com apoio. Eu tive uma sorte danada, recebi apoio popular. Chegavam perto de mim e falavam que estavam rezando. A gente se comove muito. E também tive apoio dos amigos, do presidente, de meus colegas no governo.

“Eu quero Neymar e o Ganso na Seleção.
Eles trouxeram alegria de volta para o futebol”
ISTOÉ – A sra. rezava?
Dilma – Ah, você reza, sim. E reza principalmente porque não é o câncer que é ruim, é o tratamento.
ISTOÉ – A sra. tem medo que o câncer volte?
Dilma – Hoje não.
ISTOÉ – Como a sra. encara a vida depois disso?
Dilma – A gente dá mais valor a coisas que costumam passar despercebidas. Você olha para o sol e fica pensando se você vai poder continuar vendo esta coisa bonita. Você fica mais alerta. Só combate isso se tiver força interna. Vou contar uma coisa. Eu não conhecia a Ana Maria Braga e um dia ela me ligou e conversou comigo explicando como tinha vencido o câncer dela, que o dela era mais difícil, diferente, e que superou. Vou ter sempre uma dívida com ela, porque, de forma absolutamente solidária e humana, ela me ligou naquele momento.
ISTOÉ – Mudando de assunto, o Lula é um bom chefe?
Dilma – Sim. O Lula é uma pessoa extremamente afetiva. Ele não te olha como se você fosse um instrumento dele. Te olha como uma pessoa, te leva em consideração, te valoriza, brinca. Ele tem uma imensa qualidade: ele ri, ri de si mesmo.
ISTOÉ – A sra. também será assim como chefe? Porque dizem que a senhora é o contrário disto, durona...
Dilma – Você não pense que o Lula não é duro não, hein. É fácil até para você cobrar, em função disto. Basta dizer: amanhã tem reunião com o Lula. Simples...
ISTOÉ – As reuniões são muito longas?
Dilma – A busca de um consenso é um jeito que criamos no governo. Algumas vezes o presidente chamava isto de toyotismo. Não é a linha de montagem da Ford, onde cada um vai olhando só uma parte. É aquele método de ilha da Toyota, porque você faz tudo em conjunto. Outra coisa é que a gente sempre discute com os setores interessados. Sabe como saiu o Minha Casa, Minha Vida? Porque nós sentamos com eles (empresários da construção civil) e conversamos. Eles criticando o que se fazia, os 13 grandes mais a Câmara Brasileira da Indústria da Construção Civil. Se você não fizer isso, se não for absolutamente exaustivo no debate do detalhe, o projeto não fica em pé. Na curva ele cai.
ISTOÉ – Hoje todo mundo comenta, inclusive dentro do partido, que, a partir da entrada do presidente na campanha, suas chances de vitória aumentam. A sra. traz essa expectativa também?
Dilma – Do nosso ponto de vista já é dado que o presidente participa. Nós nunca achamos que ele vai chegar um dia e participar depois. O presidente é a maior liderança do PT, a maior liderança da coligação do governo, uma das maiores lideranças do País, uma das maiores lideranças do mundo...
ISTOÉ – O fato de ter duas mulheres pela primeira vez concorrendo dará um tom diferente à campanha?
Dilma – Acho que as mulheres estão preparadas para pleitear as suas respectivas candidaturas e o Brasil está preparado para as mulheres agora. Penso que é muito importante que haja um olhar feminino sobre o Brasil. As mulheres são sensíveis e isso é uma grande qualidade. As mulheres são sensatas e objetivas até porque lidam na vida privada com condições que exigem isto. Ou você não conseguiria botar filho na escola, providenciar comida, mandar tomar banho, ir trabalhar... As mulheres também são corajosas: a gente segura dor, a gente encara.
ISTOÉ – A sra. é a favor ou contra a reeleição?
Dilma – Sou a favor. Acho muito importante.
ISTOÉ – A sra. cederia a possibilidade de uma reeleição para o presidente Lula, no caso de ele querer se candidatar em 2014?
Dilma – Ele já me disse para não responder a essa pergunta.
ISTOÉ – Até quando a sra. vai obedecer cegamente o que ele manda?
Dilma – Lula não exige obediências cegas.
ISTOÉ – A sra. acompanha futebol como o presidente Lula?
Dilma – Quero o Neymar e o Ganso na Seleção. Tenho muita simpatia pelo Ganso, aquele jeito meio desconcertado de falar. Mas gosto dos dois. Eles trouxeram alegria de volta para o futebol. Jogam de forma desconcertante e atrevida.



quarta-feira, 5 de maio de 2010

“Um pássaro na mão ou dois voando”

Escolhas eleitorais
por Marcos Coimbra, em O Estado de Minas, via Nassif

Para a vasta maioria da população, a eleição pouco (ou nada) tem a ver com algo tão distante quanto a escolha de um modelo de capitalismo.
Não faz muito tempo, um dos mais renomados articulistas de um importante jornal carioca iniciou sua coluna com uma pergunta natural para esta época do ano: o que terá mais peso nas decisões que os eleitores vão tomar na hora de escolher em quem votar para presidente? Para respondê-la, oferecia, no entanto, alternativas que nada tinham de naturais: seria “a capacidade de sedução do presidente Lula e a boa situação da economia, proporcionando uma sensação de bem-estar à população” ou “a percepção de parte do eleitorado de que uma política externa radicalizada à esquerda tem reflexos inevitáveis na maneira de conduzir a política interna”?
Quem tivesse lido somente esse começo de texto talvez ficasse com a impressão de que o autor estava brincando. Em nenhum lugar do mundo uma dúvida assim faria sentido e, certamente, não no Brasil.
De um lado, só estão coisas palpáveis: um presidente que seduz a opinião pública, a economia que vai bem, as pessoas satisfeitas, uma sensação de bem-estar. Do outro, algo que já é enunciado como limitado (“a percepção de parte….”), que põe na mesa uma noção que pouquíssimas pessoas saberiam o que é (“política externa radicalizada à esquerda…”) e que faz uma suposição cuja demonstração é complicada (“reflexos inevitáveis… na política interna”).
É difícil imaginar escolha mais fácil para a quase totalidade da população brasileira: na balança, em um prato estaria seu bem-estar, no outro, uma abstração a respeito de outra abstração. Quem aposta o que a maioria faria sem titubear?
O curioso no artigo é que a pergunta não era retórica. E que o autor não a fazia por redução ao absurdo, para mostrar o equívoco de quem imagina que a agenda da “esquerdização” da política externa possa ter qualquer impacto eleitoral relevante.
Mas não são apenas os jornalistas que fazem, às vezes, perguntas sem sentido. Até os mais ilustres líderes políticos as cometem.
Domingo, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso voltou aos jornais, agora para “reavaliar as diferenças e críticas recíprocas entre PSDB e PT”.
Em tom menos combativo do que vinha usando nas suas recentes intervenções (talvez em sintonia com a orientação de evitar o confronto direto com Lula, emanada do comando da campanha Serra), FHC falou de continuidades, sem comparar governos. Nem sequer foi para a “guerra dos números” para a qual havia desafiado o PT. Magnânimo, propôs que o Bolsa-Família fosse visto como exemplo dos programas que, “independentemente de que governo os tenha iniciado ou melhorado, tiveram o apoio de todos os partidos e da sociedade”.
Seu artigo termina com uma declaração e uma pergunta. Para ele, as diferenças entre Serra e Dilma, mais dia, menos dia, recairão sobre “a verdadeira questão” (uma só, pois as outras, imagina-se, não seriam “verdadeiras”): “Queremos um capitalismo no qual o Estado é ingerente, com uma burocracia permeada por influências partidárias e mais sujeita à corrupção, ou preferimos um capitalismo no qual o Estado permanecerá básico, mas valorizará a liberdade empresarial, o controle público das decisões e a capacidade de gestão?”. No primeiro corner, estaria Dilma, no segundo, Serra.
Com a biografia que tem, é difícil acreditar que o ex-presidente pense da forma como se expressa. Para a vasta maioria da população, a eleição pouco (ou nada) tem a ver com algo tão distante quanto a escolha de um modelo de capitalismo (“Estado ingerente X Estado básico”). Nem é claro como os dois candidatos seriam classificados. Serra, por exemplo, seria ingerente ou básico? E Dilma? Quem sabe os dois não seriam as duas coisas? E quem falou que PSDB e PT têm, para as pessoas comuns, imagens tão diferentes no tocante à partidarização do governo, sujeição ao risco da corrupção, valorização da iniciativa privada, controle público e capacidade de gestão? Quem disse que elas só enxergam virtudes em um e defeitos no outro?
Nas eleições deste ano, a população brasileira não se fará perguntas sem sentido ou indagações estratosféricas. Para ela, as escolhas serão bem mais concretas: continuar ou mudar? Um pássaro na mão ou dois voando? Ela ou ele?
É concreto, embora simples não seja.